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Trigo: pesquisa faz média de produtividade saltar 5 vezes

Com a contribuição da pesquisa, a média de produtividade em trigo cresceu cinco vezes nas lavouras brasileiras

No início dos anos 2000, a produção brasileira de trigo atendia apenas 30% da demanda nacional. Na safra 2022, a produção supriu 83% da demanda.

Num cenário de contínuo crescimento de área e manutenção dos índices de produtividade nas lavouras, a autossuficiência em trigo poderá ser alcançada nos próximos anos.

Projeções indicam que, caso a produção de trigo continue crescendo 10% ao ano, o Brasil poderá chegar aos 20 milhões de toneladas até 2030.

Com a contribuição da pesquisa, a média de produtividade em trigo cresceu 5 vezes nas lavouras brasileiras.

Na safra 2022, os rendimentos variaram de 3 mil kg/ha (cultivo de sequeiro) a 10 mil kg/ha (irrigado), resultado do desenvolvimento de cultivares com ampla adaptação, estabilidade no rendimento e resistência a doenças.

O programa de melhoramento genético de cereais de inverno conduzido pela Embrapa Trigo tem sido determinante para o crescimento dos cultivos de inverno nos mais diversos ambientes do país e demonstra a contribuição do centro de pesquisa para que o Brasil alcançasse nos últimos anos rendimentos recordes.

Com o consumo interno estimado entre 12 e 14 milhões de t., o Brasil poderá exportar o superavit para o mundo, saindo de grande importador para entrar na lista de países exportadores de trigo no mercado internacional.

Atualmente, são 124 cultivares de trigo, 21 de cevada, 16 de triticale, 4 de aveia e 3 de centeio disponibilizadas para a agropecuária desde a criação da unidade, em outubro de 1974, em Passo Fundo (RS).

De acordo com a Embrapa, no trigo, foram desenvolvidas cultivares para os mais diferentes usos, como fabricação de pães, massas, bolachas e biscoitos, além de trigos para alimentação animal em forma de grãos ou forragem conservada.

Atualmente, de cada dez cultivares de trigo que estão no mercado, sete contam com germoplasma da Embrapa.

Da pecuária aos grãos

A criação da Embrapa Trigo revolucionou a paisagem rural na Região Sul nos anos 1970, com a gradual substituição dos campos de pecuária extensiva, em solos ácidos e cobertos por capim barba de bode, pelas lavouras de grãos e cultivo de pastagens para suprir a pecuária.

“A criação da Embrapa Trigo tinha a finalidade de reduzir a dependência externa do Brasil por trigo. As importações oneravam os cofres públicos e a escassez desse cereal ameaçava a segurança alimentar da população”, conta o pesquisador Gilberto Cunha.

Segundo ele, nas primeiras tentativas de produzir trigo no sul do Brasil, seja pela importação de semente ou usando as trazidas pelos imigrantes europeus, especialmente quando eram trigos de inverno, as lavouras acabavam dizimadas, seja por doenças, pela toxidez do solo ou por falta de frio para cumprir o ciclo.

Contudo, com a missão de viabilizar soluções tecnológicas para o desenvolvimento sustentável do agronegócio de trigo e de outros cereais de inverno no Brasil, a Embrapa Trigo dedicou-se inicialmente à criação de um programa de melhoramento genético, além da introdução de linhagens de trigo trazidas do Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo, com sede no México. No qual onde também foram treinados os primeiros pesquisadores que chegavam à Embrapa.

Vencida a adaptação genética, começaram a ser desenvolvidas as cultivares brasileiras de trigo visando ao crescente aumento da produtividade, evoluindo para a racionalização no uso de recursos, competitividade na qualidade tecnológica e geração de renda nos diversos elos da cadeia. Atualmente, as pesquisas estão alinhadas às novas tendências de consumo, promoção da saúde e preservação do meio ambiente.

Marcos da pesquisa

A Embrapa Trigo é uma empresa de referência na história do plantio direto no Brasil. Os primeiros cultivos com plantio direto na palha, adaptação de máquinas e capacitação de agricultores iniciaram no norte do Rio Grande do Sul, onde está localizada a unidade.

Nos últimos anos, novos problemas associados ao manejo do solo exigiram a revisão das práticas em uso, direcionando para o novo conceito de sistema plantio direto, que tem uma visão mais abrangente envolvendo, além do revolvimento mínimo do solo e da semeadura na palha, também rotação de culturas e cultivo permanente do solo, sistema colher-semear, em associação com outras práticas de conservação do solo e da água que têm sido amplamente difundidas junto à assistência técnica e a extensão rural.

O programa de controle biológico de pulgões no trigo até hoje é reconhecido como um caso de sucesso na comunidade científica mundial. Criado em 1978, através da parceria entre pesquisadores da Embrapa Trigo e da Universidade da Califórnia, o trabalho teve por base a introdução de inimigos naturais nos trigais brasileiros, especialmente uma espécie de vespa capaz de parasitar o pulgão, principal praga do trigo na década de 1970.

Os parasitóides foram criados em larga escala no laboratório de entomologia da Embrapa Trigo e liberados nas lavouras. A redução no uso de inseticidas chegou a 855 mil litros por ano. Ainda hoje, os danos causados por pulgões não têm sido significativos, mostrando que o controle biológico de afídeos no trigo continua ativo no ambiente. Agora as pesquisas estão voltadas ao monitoramento dos afídeos e ao desenvolvimento de

Para atender ao crescente mercado de proteína animal, foram desenvolvidas as primeiras cultivares de trigos com duplo propósito, disponibilizadas de forma inédita pela Embrapa Trigo em 2002, com o objetivo de ampliar a oferta de forragem para um rebanho de 25 milhões de cabeças existentes na Região Sul.

Com ciclo mais longo, o trigo de duplo propósito permite a alimentação dos animais em época de escassez de forragem, possibilitando o pastejo durante o outono e o inverno, com posterior colheita de grãos ou silagem.

Além disso, a tecnologia resultou no aumento na média de produção de leite de diversas propriedades de agricultura familiar, passando de 10kg de leite/vaca/dia para mais de 20 kg de leite/vaca/dia. Com isso, a tecnologia deu início a novas linhas de pesquisa voltadas ao forrageamento animal com o lançamento de cultivares de trigo, triticale, centeio, aveia e cevada.

Qualidade ao gosto do consumidor

Com o fim da intervenção estatal na compra do trigo no início da década de 1990, o setor passou a sofrer pressão por atributos de qualidade em conformidade com os parâmetros utilizados no mercado internacional.

Assim, acompanhando o aumento no rendimento das lavouras brasileiras que configurou novos cenários para a cultura, foi necessária a adaptação do sistema produtivo às exigências do consumidor.

O desenvolvimento de cultivares, até então dominado pelos trigos brandos, foi rapidamente substituído por trigo pão e melhorador, com qualidade tecnológica equivalente aos grãos importados da Argentina ou Canadá.

Até hoje, a demanda crescente pelos produtos industrializados com características específicas na alimentação humana (massa amarela, pão branco, biscoito crocante, alimentos infantis e espessantes) e para alimentação animal (maior teor de proteínas, fibras e aminoácidos) tem orientado a seleção de cultivares que serão utilizadas nas lavouras.

Novas fronteiras

O avanço da soja para o Centro-Oeste do Brasil levou junto o trigo. O programa de melhoramento genético de trigo para o Cerrado foi intensificado na Embrapa na década de 1980, com a oferta das primeiras cultivares poucos anos depois.

O foco das pesquisas na época era sobre o sistema de produção, como encaixe na rotação de cultura da região, zoneamento climático, identificação de possíveis pragas e doenças da região tropical, disponibilidade de máquinas e insumos.

Em 2012, a Embrapa instalou em Uberaba (MG), o Núcleo Avançado de Trigo Tropical, onde uma equipe de pesquisadores e assistentes desenvolvem ações em melhoramento genético, manejo e transferência de tecnologia para trigo tropical. Outro importante apoio está na Embrapa Cerrados, em Planaltina (DF). Com suporte da pesquisa e o setor produtivo melhor organizado, rapidamente o trigo expandiu e conta com o cultivo indicado para os estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Bahia, Goiás e Distrito Federal.

Novas fronteiras nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, estão sendo prospectadas pela pesquisa em parceria com produtores, indústria moageira e institutos federais de pesquisa. Levantamento da Embrapa Territorial mapeou 2,7 milhões de hectares na região do Cerrado que podem ser cultivados com trigo, sem necessidade de abrir novas áreas.

No Rio Grande do Sul, atualmente maior produtor de trigo no País, também estão sendo abertas novas fronteiras para o cereal. O avanço da soja na Metade Sul do Estado abriu espaço para a triticultura, seja para a produção de grãos ou como forragens para engorda do gado no inverno.

Sistemas de drenagem em áreas de várzea, em rotação com arroz e milho, estão sendo desenvolvidas em parceria para a Embrapa Clima Temperado, assim como modelos de ILPF com cereais de inverno são avaliados em conjunto com a Embrapa Pecuária Sul.

Segurança Alimentar

O melhoramento genético tem buscado amenizar o problema da qualidade nutricional do trigo pelo aumento da concentração de proteínas e um balanço mais adequado de aminoácidos no grão.

Os principais avanços estão associados com uma menor concentração de Ácido Fítico, que implica em farinhas de trigo com concentração mais elevada de Fósforo, Magnésio e Manganês, reduzindo assim o uso de aditivos durante a industrialização dos alimentos.

“Alimento de qualidade e com oferta capaz de atender tanto os brasileiros quando o mercado internacional é o que move a Embrapa Trigo rumo ao futuro”, conclui o chefe-feral da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski.

Fonte: https://www.canalrural.com.br/